Num país que assegura a liberdade de expressão a todos, o discurso do ódio vem se propagando num ritmo galopante desde a eleição de Donald Trump, em 2016. E o conteúdo virulento das mensagens enviadas pelo presidente dá munição e encoraja extremistas.
Durante a campanha, ele entoou mantras como “o Islã nos odeia”. Já eleito, tentou manter-se imparcial, colocando no mesmo patamar extremistas que disseminam o ódio e ativistas que o combatem, num tema que claramente não dá espaço à neutralidade de um líder: Trump alegou ver “pessoas muito boas em ambos os lados” após confrontos deflagrados por um protesto de supremacistas contra negros, judeus, gays e imigrantes em Charlottesville, Virgínia.
A retórica do presidente à sua base insuflou a direita radical, tirando da sombra um mosaico de grupos supremacistas adormecidos desde a década de 1970. “Trump nos empoderou”, declarou David Duke, ex-líder da Ku Klux Klan, considerado pela Liga Antidifamação o mais conhecido antissemita e racista americano.
Tanto o FBI quanto entidades que monitoram grupos extremistas registram o aumento de crimes de ódio. Um relatório da Liga Antidifamação, por exemplo, revelou que em 2017 incidentes antissemitas cresceram 57% e episódios de ódio contra muçulmanos, 15% em relação ao ano anterior.
Já o Government Accountability Office, que fornece dados do governo para o Congresso americano, mostra que desde o 11 de Setembro radicais de extrema-direita cometeram no país três vezes mais ataques do que os de origem islâmica.
As leis de crime de ódio foram promulgadas em 45 estados e no Distrito de Colúmbia, destinadas a enquadrar quem comete violência motivado por preconceitos a raça, religião, orientação sexual, deficiência ou gênero.
“Os americanos são livres para pensar, pregar e acreditar no que quiserem. Mas o estatuto do crime de ódio pode ser desencadeado quando alguém comete uma ação violenta baseado nestas crenças preconceituosas”, relatou o advogado Michael Lieberman, da Liga Anti-Difamação, em artigo no “Washington Post”.
Cesar Altieri Sayoc, acusado de enviar pacotes-bomba a políticos nos EUA — Foto: Broward County Sheriff’s Office/Handout via Reuters
Quando, na mesma semana, um homem branco entra numa mercearia no Kentucky e atira, a esmo, em dois negros, outro abre abre fogo numa sinagoga em Pittsburgh, fuzilando 11, e um terceiro manda, da Flórida, 14 cartas-bomba a críticos do presidente, americanos se perguntam o que fazer para estancar o ciclo de violência promovido pelo ódio.
“É uma coisa muito terrível o que está acontecendo com o ódio no nosso país. Alguma coisa tem que ser feita”, afirmou Trump logo após o ataque de Pittsburgh. Suas propostas, contudo, não combatem as causas: o presidente defendeu guardas armados em locais de culto e a pena de morte para autores de massacres.
O prefeito de Pittsburgh, Bill Peduto, contestou a solução de Trump: “O que precisamos é entender como tirar as armas — que é o denominador comum de todo tiroteio em massa nos EUA — das mãos daqueles que estão procurando expressar o ódio pelo assassinato.”