Manaus, 24/04/2024

Amazonas

Primeira turma de professores indígenas do Vale do Javari se forma na UEA

Primeira turma de professores indígenas do Vale do Javari se forma na UEA
20/12/2022 12h00

Solenidade de colação de grau ocorreu na sexta-feira (16) (Foto: Daniel Brito/UEA).
Atalaia do Norte (AM) – Trinta e quatro universitários colaram grau no curso de Pedagogia Intercultural Indígena, pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA), na região da reserva indígena Vale do Javari, em Atalaia do Norte ( a 1.136 quilômetros de Manaus). A cerimônia ocorreu no fim de semana.

Os formandos pertencem às etnias Marubo, Matis, Matses e Kanamari, espalhadas pela terra indígena do Vale do Javari, localizada na região da tríplice fronteira – Brasil, Peru e Colômbia –, onde vive o maior número de grupos indígenas em situação de isolamento voluntário do mundo. A UEA é a primeira instituição do país a oferecer esse tipo de formação.

A solenidade de entrega dos diplomas contou com a presença da vice-reitora da UEA, Prof.ª Dra. Kátia Couceiro.

Hoje é dia de festa. Não me recordo, ao longo de meus anos como professora na UEA, de um momento tão especial e emocionante como esse. É muito bonito ver a alegria estampada nos rostos de todos vocês. Estamos formando profissionais que se dedicaram arduamente e que, a partir de agora, levarão o nome da UEA para as suas comunidades. Essa é a nossa missão”, disse a vice-reitora.

Durante a colação, foi apresentado vídeo do reitor André Zogahib parabenizando a turma, todos os coordenadores e os 24 docentes envolvidos na realização do curso, sendo quatro deles indígenas.

“É com muita satisfação que a UEA forma 34 professores indígenas que irão trabalhar nas comunidades do Vale do Javari. São profissionais da mais alta competência, da mais alta qualidade, que vão prestar serviços, também, em suas comunidades indígenas”, ressaltou.

Valorização

Ao todo, 34 alunos receberam o diploma (Foto: Daniel Brito/UEA).
Da etnia Kanamari, José Ninha Tavares, 49, explica que a vontade de querer ser professor surgiu da necessidade que seu povo tem na área da educação. Segundo ele, os conhecimentos não-indígenas são totalmente diferentes da realidade das comunidades, o que acaba dificultando o aprendizado.

Precisamos valorizar e fortalecer o que é nosso, pois o aluno precisa entender, primeiramente, o seu próprio mundo para, depois, descobrir novos conhecimentos. Por isso, é importante assumirmos o papel de educador”, pontuou Tavares, um dos mais emocionados durante a cerimônia de colação de grau.

Curso sem evasão – O curso Pedagogia Intercultural Indígena, ofertado por meio do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor) e vinculado à Escola Normal Superior da UEA, teve como coordenadora a Prof.ª Dra. Célia Bettiol, que se empenhou para evitar a evasão. Ela contou com a ajuda da coordenadora pedagógica do curso, Prof.ª Dra. Ádria Duarte; do linguista do curso, Prof. Dr. Sanderson de Oliveira, escolhido como paraninfo da turma; e da coordenadora local do Parfor, professora Zilma da Costa. “Não houve desistência. O curso iniciou com 35 alunos e terminou com 34 formandos. Infelizmente, perdemos um durante a pandemia da Covid-19”, destacou a professora Célia.

Segundo a coordenadora, as aulas tiveram ênfase na língua própria de cada etnia e o uso do português como segundo idioma. Também foram utilizados materiais didáticos específicos com o objetivo de contemplar o fortalecimento dos saberes tradicionais.

Para escolas indígenas, professores indígenas. Essas escolas são interculturais, bilíngues, específicas de um povo. Por isso é tão importante ter professores indígenas formados que possam cuidar do processo pedagógico e fazer a diferença no sentido de dialogar os conhecimentos da sociedade com os saberes de seu próprio povo”, explicou a professora Célia Bettiol.

A cerimônia de colação de grau, que reuniu formandos, seus familiares e professores, aconteceu no ginásio Professor Lucival Brotas, e contou, também, com a presença do prefeito de Atalaia do Norte, Dênis de Paiva; da coordenadora regional substituta da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mislene Mendes; entre outros representantes da sociedade civil.

Etnias e a educação

Os professores indígenas das etnias Marubo, Matis, Matses e Kanamari são povos que tiveram o contato com a sociedade nacional intensificado a partir da década de 1970. A escolarização desses povos teve início a partir do final da década de 1980.

Na década de 1990, começou a ser ofertado o curso de formação em níveis fundamental e médio, oferecido pela Secretaria de Estado da Educação e do Desporto. Naquele período, os alunos tiveram suas formações interrompidas por conta de uma pandemia de Cólera e Hepatite Delta que afetou todo o território do Vale do Javari.

Durante a pandemia de Covid-19, na última etapa antes do encerramento do curso de nível superior, as aulas foram suspensas em respeito às medidas de biossegurança. Neste período, o curso esteve em luto pela perda do aluno Benedito Marubo, o primeiro professor indígena de seu povo e sábio conhecedor do Vale do Javari.

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