A única filial do Teatro Bolshoi fora da Rússia fica no Brasil, localizada na cidade de Joinville, em Santa Catarina, onde dois meninos paulistas foram aceitos como integrantes no começo de outubro.

Apesar da pouca idade, Leo Joaquim de Lima Ewald, de 8 anos, e Antonio Carlos Nascimento Trindade, de 10 anos, e outras 37 crianças superaram mais de 4 mil inscritos, em uma competição com aproximadamente 100 candidatos por vaga, conquistando seus lugares como mais novos alunos na unidade artística e cultural.

Como entrar no Bolshoi?

Para ser aceito na escola, o candidato precisa passar pelo processo seletivo da instituição e cumprir as etapas eliminatórias e consecutivas, sendo que o candidato pode ser dispensado a qualquer momento, em caso de não cumprimento de determinado quesito:

• Exame Médico-Fisioterápico: para os candidatos ao Curso de Dança Clássica, a etapa engloba avaliação física, clínica, postural, específica e somatotipo, visando avaliar a aptidão física para a atividade;
• Etapa Artística: aulas lúdicas, sem necessariamente conhecimento em dança, englobando avaliação artística, musical e cognitiva, visando aferição de habilidades técnicas e artísticas dos candidatos.

Seleção nacional

Nesta categoria voltada às crianças de 8 a 11 anos, que não precisam ter conhecimento em dança, são realizadas inscrições via site ou participação em pré-seleções pelo Brasil, de acordo com o cronograma da instituição.

A inscrição direta no site, sem passar pela pré-seleção, necessita de vídeo, conforme modelo sugerido pela escola. Na seleção nacional, as atividades ocorrem de forma presencial.

Chamada especial

Já na “Chamada Especial”, para bailarinos com conhecimento em dança, é necessário um vídeo, conforme regras estipuladas em edital. Após a avaliação do material enviado, os pré-selecionados são convocados para que realizem a etapa presencial.

Os candidatos aprovados iniciam no 1º ano da instituição. Para os alunos aceitos em 2023, o início está previsto em 2024. O curso tem duração total de 8 anos.

Rumo à aprovação

Nascido e alfabetizado na Alemanha, Leo é filho de uma brasileira e pai estrangeiro. Vanuire de Lima, mãe do dançarino, conta que o filho fez a primeira prova em maio de 2023, na cidade de Bertioga, litoral de São Paulo, quando ainda treinava Ginástica Olímpica.

Por conta da mudança da família para a cidade de Campinas, o menino, que já havia praticado balé, voltou a praticar a modalidade, já que não havia Ginástica Olímpica no local.

“Comentamos que ele já havia sido aprovado na primeira fase do Bolshoi e as professoras puxaram ele no alongamento. Foi bom para turma toda. Essa foi a preparação que ele teve”, diz Vanuire, ex-bailarina profissional e artista de circo.

Em Joinville, a mãe conta que Leo fez testes médicos, de coordenação motora e flexibilidade, musicalização e artístico, além de uma provinha em português.

Filho de pai lutador, Leo também praticava lutas, mas escolheu o balé quando ambas as modalidades coincidiram de horário, o que desagradou o pai. Porém, a inspiração na irmã, que também pratica a dança, falou mais alto.

A mãe, que é separada do pai do menino e mora de favor na cada dos pais, conta que não tem condições de se mudar para Joinville com todos os filhos.

“A ideia seria o Leo ir para uma mãe social, que são pessoas que acolhem eles lá. Ele é muito novo, é uma grande dificuldade de tomar essa decisão. Eu sou muito orgulhosa de ver que meu filho foi aprovado em uma das melhores escolas do mundo. Vão formar caráter também, pois a criança fica lá várias horas por dia em uma escola com método rigoroso. É uma oportunidade única para ele”.

Na lista dos aprovados também consta o nome de Antonio Trindade, morador de Ubatuba, também no litoral paulista, que aos 7 anos ingressou na Experimental Dance Company, por meio de um projeto social chamado “Sonhos Dançantes”, onde conquistou uma bolsa de 100%.

Quando iniciou na escola de dança, fazendo Jazz, a escola notou que Antonio tinha potencial para o Balé. Quando foi oferecida a oportunidade de fazer uma aula, o menino se apaixonou pela modalidade e se destacou. Foi então que a instituição começou a prepará-lo para fazer o teste do Bolshoi.

Em 14 de setembro, um vídeo da criança foi enviado ao Bolshoi, já que não havia nenhuma cidade próxima onde ele pudesse participar da seletiva de forma presencial. A tão aguardada resposta veio na semana seguinte, com a aprovação e convite para a etapa presencial, que ocorreu nos dias 6 e 7 de outubro na sede em Joinville.

A mãe, Ivone Trindade, que é faxineira, agora conta que o maior desafio será fazer a mudança com os dois filhos para a cidade, já que o pai do menino é falecido.

“Minha expectativa é aprender muito com os mestres do balé para no futuro ser um bailarino profissional, conseguir dançar no Bolshoi na Rússia e melhorar a vida da minha família”, diz Antonio.

Desafios dos aprovados

Os novos alunos ganham bolsa de estudos e ensino gratuito. Os benefícios são oferecidos pelos “Amigos do Bolshoi”, uma extensa lista de parceiros que oferece alimentação, transporte, uniformes, figurinos, assistência social, orientação pedagógica, assistência odontológica preventiva, atendimento fisioterápico, nutricional e assistência médica de emergência/urgência pré-hospitalar.

Apesar dos benefícios concedidos, os aprovados precisam custear as despesas com moradia, alimentação fora da escola e de matrícula no curso de ensino regular, além de todos os gastos pessoais que envolvam suas rotinas, tornando-se um verdadeiro desafio para as famílias de baixa renda.

Para lidar com a situação, muitas delas acabam pensando em alternativas criativas para ajudar os filhos durante as jornadas de estudos, como rifas e vakinhas virtuais, como as elaboradas pela mãe de Leo.

A Escola Bolshoi no Brasil

A história da filial brasileira remonta o ano de 1995, quando o então diretor artístico do Teatro Bolshoi, Alexander Bogatyrev, idealizou um projeto para que outras nações pudessem conhecer a metodologia empregada na matriz russa.

Em 1996, a companhia passou pelo Brasil em turnê e a cidade de Joinville foi incluída no roteiro. Após a apresentação, Bogatyrev começou a esboçar propostas para montar uma unidade no país.

Em 1998, o idealizador do projeto faleceu. As bases da proposta, contudo, já estavam concluídas e foram apresentadas junto às autoridades políticas locais. Em 20 de julho de 1999, durante a abertura do 17º Festival de Dança de Joinville, Alla Mikhalchenko, primeira bailarina do Teatro Bolshoi, assinou um protocolo com o então prefeito que, além de empenhar-se nos processos burocráticos e institucionais entre o Brasil e a Rússia, disponibilizou uma área de aproximadamente 6 mil metros quadrados para abrigar a unidade que foi oficialmente fundada em 2000.

Os alunos aceitos na escola têm à disposição diversos ambientes: Ateliê, Biblioteca, Cantina, Espaço Cultural, Estúdios de Piano, Laboratório Cênico, Núcleo de Saúde, Sala de Ginástica e Sala de Aula, onde crianças e jovens recebem educação, aprendem uma profissão e se movimentam para driblar os desafios da vida.