“Meteram uma sacola plástica cheia de fezes humanas na cabeça de um estudante universitário”, conta.
“Ouvi pessoas que foram estupradas com objetos pontiagudos, que foram alvo de choques elétricos, outras que foram vendadas por dias até perderem a consciência.”
Abusos de direitos humanos
Os dois ex-agentes penitenciários que falaram com a BBC confirmaram a ocorrência de tortura, mas negaram ter participado.
“Vi pessoas sendo agredidas, amarradas, suspensas por seus punhos em um corrimão de uma escada e com os pés mal tocando o chão”, diz Víctor.
“Eles usavam um carregador de bateria de carro com dois cabos conectados à pele dos detentos para dar choques elétricos”, acrescenta Manuel.
“A tortura era sistemática”, acrescenta. “Era uma prática normal”.
Muitos desses casos foram documentados por organizações de direitos humanos internacionais e, em fevereiro de 2018, a Corte Penal Internacional abriu uma investigação preliminar sobre violações de direitos humanos cometidas durante os protestos.
O governo venezuelano se comprometeu a cooperar com a investigação.
Deixado para morrer
Em outubro de 2016, depois de passar dois anos e meio no Helicóide, Mantilla ficou tão doente que as autoridades permitiram que fosse operado em uma clínica.
O procedimento foi autorizado por um juiz, mas, no momento da operação, o SEBIN interveio. Gritando de dor, Mantilla foi retirado da clínica e obrigado a voltar ao Helicóide, onde permaneceu na solitária.
“Era como se você tivesse uma doença terminal, te trancassem em uma sala e dissessem que você nunca seria libertado. Eles estavam me condenando à morte”, diz.
Vídeos que circularam nas redes sociais mostram Mantilla gritando palavras de ordem ao ser retirado da clínica e levado em um veículo do SEBIN. Organizações humanitárias internacionais pediram que ele fosse libertado.
Depois de dez dias, o governo cedeu à pressão, e Mantilla foi transferido inicialmente para um hospital militar, então para uma clínica, onde finalmente foi operado.
Mantilla foi libertado oficialmente em novembro de 2016 e, poucos dias depois, empossado como deputado – quando passou a testemunhar sobre o que tinha visto e vivido no Helicóide.
“Crimes contra a humanidade não têm prazo de validade”, diz ele.
Exílio
Mas Mantilla nunca se sentiu em segurança depois que foi libertado e, em julho de 2017, deixou a Venezula rumo à França. Ele recebeu asilo em maio do ano passado.
De seu novo endereço, ele ainda acompanha de perto os desdobramentos na Venezuela, e espera voltar algum dia à sua terra-natal. O período que passou preso no Helicóide mudou sua vida para sempre.
“Nunca mais fui o mesmo… É complicado porque, de alguma forma, o Helicóide foi a minha casa por dois anos e meio. Embora tente negar isso, muito de mim permaneceu lá.”
Manuel e Víctor também deixaram a Venezuela e vivem no exterior.
Em maio de 2018, prisioneiros do Helicóide se rebelaram em protesto às suas precárias condições de vida. Em consequência, vários deles foram libertados ,e o governo prometeu melhorias.
Mas, segundo depoimentos de quem permanece lá, pouco foi feito para mudar a situação.
A BBC News Mundo tentou contatar o governo da Venezuela por diversas vezes sobre as acusações dentro do Helicóide, mas não obteve resposta.