Prodígio infantil do mercado fonográfico na década de 1990, revelada em dupla formada com o irmão Junior Lima, a cantora paulista adolesceu e cresceu em público. Em todos os sentidos.
Aos 35 anos, festejados em janeiro, Sandy explicitou esse crescimento artístico ao longo de 2018 através das conexões com artistas de outros universos e gerações – mote do projeto multimídia Nós, Voz, Eles.
No palco da casa carioca KM Vantagens Hall, na qual Sandy não se apresentava desde que fazia dupla com Junior, a cantora mostrou a evolução como intérprete e como compositora, se expandindo em cena em apresentação coesa que expôs, de quebra, o toque entrosado da banda formada por Marinho Lima (bateria), Michel Cury (piano), Tiago Palone (baixo), Edu Tedeschi (guitarra e violão) e João Milliet (também na guitarra e no violão).
Dos oito convidados do projeto Nós, Voz, Eles, somente o pai Xororó compareceu na noite de sábado, 22 de dezembro, para refazer ao vivo o terno dueto com a filha em Meu disfarce (Chico Roque e Carlos Colla, 1987), balada lançada há 31 anos nas vozes anasaladas da dupla sertaneja Chitãozinho & Xororó.
Os demais convidados – Anavitória, Iza, Lucas Lima (diretor musical do show), Maria Gadú, Mateus Asato, Melim e Thiaguinho – foram vistos e ouvidos virtualmente através de telão, sem prejuízo para a fluência do show. Tiago Iorc não participou do disco, mas também deu as caras no telão para cantar Me espera (Sandy Leah, Tiago Iorc e Lucas Lima, 2016), obra-prima do repertório da carreira solo de Sandy.
Ver e ouvir Sandy caindo com desenvoltura no swing pretensamente jazzístico dos arranjos das músicas No escuro (Sandy Leah e Lucas Lima, 2018) e Ponto final (Sandy Leah, Lucas Lima e Tati Bernardi, 2013) é a prova irrefutável da evolução da artista.
À vontade no cenário-casa arquitetado por Zé Carratu, Sandy se movimentou bem cena. Para o público, que puxou espontaneamente sucessos da dupla Sandy & Junior como As quatro estações (Sandy Leah e Álvaro Socci, 1999) e Inesquecível (Incancellabile) (Giuseppe Carella, Fabrizio Baldoni, Gino De Stefani e Cheop, 1996, em versão em português de Claudio Rabello, 1997), Sandy será sempre a voz dos sonhos e hits adolescentes.
A artista pareceu ter consciência disso ao longo da apresentação. Afagou o ego dos fãs, convocou um deles para ficar ao lado dela no palco, na interpretação de Tempo (Sandy Leah e Lucas Lima, 2010), e fez todo um jogo de cena para ser manter querida por esse público.
Cego pelo brilho reluzente da estrela dessa cena, o público talvez nem tenha notado a marcação forte da bateria de Marinho Lima em Perdida e salva (Sandy Leah e Lucas Lima, 2010) ou o seguro toque da guitarra de João Milliet em Grito mudo (Sandy Leah, Lucas Lima e Daniel Lopes, 2018), desempenhando bem a função que, na gravação de estúdio, coube ao guitarrista Mateus Asato.
Justamente por ter o incondicional aval popular, Sandy nunca foi devidamente valorizada pela crítica musical, cujos ouvidos estiveram sempre desatentos aos sinais de beleza melódica emitidos por canções como Morada (Sandy Leah, Tati Bernardi e Lucas Lima, 2013).
A propósito, dentro do arco pop em que gravita o projeto Nós, Voz, Eles, o repertório resultou de bom nível. O show confirmou a fluência pop de Pra me refazer (Sandy Leah, Lucas Lima, Ana Caetano, Vitória Falcão e Deco Martins, 2018) e Um dia bom, um dia besta (Sandy Leah, Lucas Lima e Juninho Bill, 2018), músicas gravadas por Sandy com a dupla Anavitória e com o cantor Thiaguinho, respectivamente.
Enfim, Sandy cresceu. Mesmo que continue sendo eternamente adolescente no imaginário popular, a cantora que faz 36 anos em 28 de janeiro de 2019 soube usar a bela voz, de timbre sempre juvenil, para ir além, evidenciando na carreira solo uma obra autoral que foi sendo lapidada com o tempo.
E Sandy veio caminhando no próprio tempo, segura de cada passo, alheia ao fato de que o ardoroso séquito da artista – ele, sim, por vezes ainda aparentemente cristalizado em algum lugar do passado de Sandy & Junior – pareça se recusar a crescer e a envelhecer como a artista que idolatra com fervor inabalável. (Cotação: * * * *)